quarta-feira, 27 de agosto de 2008

A afronta

Para os antigos gregos, os seus escravos eram indivíduos desprovidos de palavra. Obviamente, não porque não conseguissem falar, mas porque, dada a sua condição, não poderem usar a palavra publicamente. Essa era uma qualidade apenas ao alcance dos homens livres – livres não só do jugo de outros homens, mas igualmente do jugo do trabalho e das tarefas do quotidiano doméstico. Por esse motivo, aos cidadãos que, tendo a possibilidade de participar na vida pública, preferiam ocupar-se dos seus negócios, os restantes gregos reservavam um não disfarçado desprezo.

Gerir silêncios faz inevitavelmente parte da vida política. Mas elevar o silêncio a uma forma de fazer política, tanto do agrado de algum PSD, revela uma perspectiva muito estreita e demasiada preocupação com o imediato. É não só um sinal de falta de fôlego e de fraqueza como uma afronta ao que a vida política devia ser.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Silêncios arriscados

A realidade social e política não se compadece com os desejos dos partidos políticos. O compromisso de um líder partidário com um período anunciado de silêncio é, por isso, uma opção demasiado arriscada. Mas, para além deste risco desnecessário, existe ainda o crescendo de expectativas quanto à primeira intervenção que marca o fim do período de retiro. Alimentar uma situação destas só é viável quando se tem a certeza de se poder estar à altura do acontecimento. Fazer melhor do que fez a última direcção do PSD não é uma tarefa árdua. Mas o PSD não pode estar em competição consigo mesmo, sob pena de enquanto assim estiver não estar em condições de competir com o PS. A José Sócrates, não falta nada para manter o predomínio sobre a agenda política do fim do Verão e ajudar a transformar o regresso do PSD num balão cheio de nada.

sábado, 23 de agosto de 2008

À deriva

Não é necessário ser um génio da estratégia de combate político para chegar à conclusão a que chegou Santos Silva. Parece que apenas no PSD ninguém percebeu que as críticas ao silêncio do governo partiam de uma casa com telhados de vidro.

A estratégia de silêncio da liderança do PSD tem sido algumas vezes apontada como errada, mas legítima. Mas o silêncio, na política, em raríssimas ocasiões é legítimo. Desde que os gregos se dedicaram a aprimorar a política como expressão da vida em comunidade que o discurso e a acção dela fazem parte. Estando na oposição e enfrentando uma maioria absoluta do PS, a acção é algo a que o PSD não pode aceder facilmente. Sobra-lhe o discurso. Abdicando dele, não lhe sobra nada.

A triste realidade do PSD é que após os excessos de Menezes e de Santana Lopes, impunha-se uma mudança profunda de orientação. A opção de Ferreira Leite foi posicionar-se no extremo oposto e comprometer-se com um silêncio monástico. Mas, para marcar a diferença após o populismo de Menezes, a solução ideal nunca poderia ser outra forma de extremismo, ainda que de sinal contrário. Bastava apenas que tivesse recorrido à característica que falta ao PSD há tanto tempo: a moderação.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

A desgraça (2)

Depois de uma capa destas, tenho uma certa curiosidade para saber o que terá andado o Record a dizer dos atletas portugueses nos JO nas últimas semanas.

A desgraça

De acordo com os critérios do COI, com uma medalha de ouro e uma medalha de prata, esta é a melhor classificação portuguesa de sempre nuns Jogos Olímpicos.

Disparates fáceis

Na última página do Público, Vasco Pulido Valente espelha bem como uma quantidade assinalável de raciocínios rápidos e desordenados podem constituir algo que passe por opinião sobre um assunto. Para VPV, os JO transformaram-se numa aberração. A maior parte das provas clássicas não faz sentido; uma parte das modalidades recentes não faz sentido; a divisão e especialização das provas não faz sentido; o futebol não faz sentido; finalmente, o treino específico que os atletas de alta competição fazem cria “monstros”, “máquinas concebidas para meia dúzia de gestos, sem beleza e sem uso”. Esta última afirmação, para ficar apenas por aqui, é tão descabida como desinformada. A ideia que Pulido Valente tem dos atletas deve basear-se sobretudo nos praticantes das modalidades clássicas que “não fazem sentido”, como o lançamento do peso e do martelo. Modalidades onde ser baixo e pesado se torna uma vantagem porque o arremesso se faz num movimento giratório. Ninguém pede a um historiador que seja um especialista em física. Mas para quem parece abnegar a especialização dos atletas, algum ecletismo para os conhecimentos básicos que a maior parte dos jovens de 16 anos é obrigado a saber talvez não fosse má ideia.

VPV confunde deporto amador com desporto profissional e talvez sinta um excesso de nostalgia dos tempos em que aristocratas com penteados de gosto duvidoso circulavam com igual graciosidade nos salões de chá e nos courts de ténis e de badminton. Deve ser daqui que nasce a defesa do golfe, esse desporto em que 99% do tempo activo de jogo é passado a olhar para relva ou para as nuvens à procura de uma bola minúscula, como modalidade olímpica.

Para provar que definitivamente não sabe do que fala, VPV chega a utilizar Michael Phelps como um exemplo, quando o nadador americano não pode ser considerado outra coisa que não seja uma excepção. De tal forma é assim, que ninguém ganha 7 medalhas de ouro nuns JO desde os anos 70 - e Phelps leva para casa oito. De resto, nem se percebe o que VPV quer dizer quando afirma que “a ginástica, a natação e o mergulho (...) são tão minuciosamente divididas que um único atleta (...) consegue apanhar oito medalhas.” Qual é a alternativa? Uma única grande prova de natação em que cada um nada o que lhe apetece? Exigir aos ginastas que saltem directamente das argolas para o cavalo de arções sem tocar no tapete? Escrever disparates é reconhecidamente fácil. Mas não devia ser tão fácil.

A opinião publicada sobre o desporto e sobre os JO tem neste texto de VPV um bom exemplo do muito que se fez por estes dias. Avança-se com ideias rápidas e sonantes, mesmo que a realidade seja uma coisa bastante mais prosaica. Pelo menos, VPV tem o mérito de não alinhar na consensual crítica ao desempenho dos atletas portugueses e ter procurado uma abordagem diferente. Aliás, um dos traços característicos de VPV é assumir-se como uma excepção à regra. Assim uma espécie de Michael Phelps, mas ao contrário.

Os bons exemplos que vêm de cima

Depois de ter anunciado, a meio dos Jogos Olímpicos, que não se recandidataria ao COP, Vicente Moura voltou ontem, no dia da primeira medalha de ouro portuguesa, com a palavra atrás. Os momentos escolhidos são curiosos, mostrando que não são apenas os atletas olímpicos que desperdiçam boas ocasiões para estar calados.

quinta-feira, 21 de agosto de 2008

As condições do sucesso

Os exemplos pontuais valem o que valem. São episódios que podem condensar em si mesmos um retrato fiel de uma determinada realidade ou que podem apenas contribuir para uma mistificação da mesma. Eu deixo a história e a minha interpretação e, a partir daí, cada um faça a leitura que quiser.

O meu irmão, agora com 22 anos, desde muito cedo começou a praticar natação. Ao chegar à adolescência iniciou-se na competição. O seu dia típico implicava despertar entre as 5:30 e as 6:00, ir de boleia com o nosso pai até à piscina (porque o início do treino não se compadecia com os caprichosos horários da Carris), passar perto de duas horas na água, ir novamente de boleia com o nosso pai para a escola, tomar um segundo pequeno-almoço durante os curtos minutos de que dispunha no trajecto para não chegar atrasado (porque o facto de ser um atleta de competição federado não lhe proporcionava maior grau de tolerância do que a qualquer outro aluno), passar uma boa parte do resto do dia em aulas, voltar para a piscina ao fim da tarde, passar outras duas horas na água, voltar para casa entre as 20:00 e as 21:00, jantar e, com quatro horas de treino, perto de 7 km de água no corpo e um dia de aulas, arranjar forças para fazer trabalhos de casa e estudar para os testes antes de ir para a cama recuperar para o dia seguinte. Na escola, surpreendentemente ou não, o nível das notas manteve-se bom, excepto, e aparentemente sem explicação, apenas numa disciplina. Quando o nosso pai lá se deslocou para tentar perceber o que se estava a passar, uma vez que as notas de final de período não correspondiam ao que as dos testes faziam prever, a professora dessa disciplina afirmou categoricamente que lhe estava a baixar a nota porque não considerava concebível que um estudante se envolvesse numa actividade tão exigente e não se dedicasse por inteiro à escola. Nenhuma argumentação e nem mesmo uma reunião com o director de turma a fizeram voltar atrás.

Desde há uns tempos que as transmissões de jogos de futebol permitem ao espectador saber quanto corre cada jogador em campo durante a partida. Agora podemos todos pasmar de admiração com futebolistas que percorrem 8 km, 10 km, 12 km num jogo só. Ontem, em Pequim, dois nadadores portugueses, Daniela Inácio e Arseniy Lavrentyev, participaram na mais dura prova de natação nas olimpíadas: os 10 km em águas abertas. Daniela Inácio nadou a distância em 2:00:59 e Arseniy Lavrentyev em 2:03:39. Ninguém pasmou por um nadador precisar de apenas mais 30 minutos para igualar as prestações dos heróis da bola. Aliás, ninguém deu sequer destaque ou importância à prova.

Os 15 milhões de euros que se investiram na missão olímpica de Pequim são um pormenor entre muitos. Em Portugal não se gosta de desporto e não se compreende o desporto. Gosta-se de ganhar e gosta-se das intrigas palacianas que enchem diariamente as capas dos jornais desportivos. Discutir se 15 milhões de euros é dinheiro a mais ou dinheiro a menos é falhar o mais importante. As condições de base para o sucesso não estão lá. Quando isso acontece não há dinheiro que salve o dia.

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Uma sociedade perigosa

No Verão passado, quando uma criança desapareceu do aldeamento turístico em que os pais se encontravam a gozar férias, não faltou quem logo apontasse o dedo acusador aos progenitores. Perante o desespero evidente de dois pais, houve quem não contivesse o seu moralismo e clamasse contra a sua incúria. Este mês, a intervenção policial para pôr cobro a uma situação de assalto com sequestro de dois reféns terminou com a morte de um dos assaltantes e o outro ferido com gravidade. Louvou-se a autoridade, o tiro certeiro e o exemplo que dará que pensar aos meliantes em futuras situações da mesma natureza. Pouco tempo depois, a GNR baleou mortalmente uma criança, numa perseguição a uma carrinha onde se encontravam também dois indivíduos apanhados em flagrante a roubar material de construção. Perante a morte de um rapaz de 12 anos, familiar dos dois ladrões, logo se perguntou o que estava o rapaz ali a fazer e que país é este em que se leva uma criança para um roubo. Umas semanas antes, um tiroteio num bairro social, do qual espantosamente apenas resultou um ferido ligeiro, fez estalar a indignação contra esse bando de oportunistas a viver das prestações sociais, que tanta ajuda recebem sem nada dar em troca. Grupos que, disse-se na altura, cultivam a exclusão e a miséria em que vivem e que são incapazes de se inserir e relacionar normalmente com o resto da sociedade.

O que todas estas histórias e os comentários que motivaram têm em comum é um manifesto desprezo pelo ser humano. Perante o sofrimento alheio, quer seja o da família de uma criança desaparecida, quer seja o da família de uma criança morta, quer seja o de duas comunidades aterrorizadas pela pequena e média criminalidade perpetrada por uma dúzia de indivíduos, quer seja, finalmente, o dos próprios criminosos que vêm decretada a sua sentença sem a interferência de qualquer tribunal, perante tudo isto há sempre quem, com toda a crueldade do mundo, consiga dizer: “estavam a merecê-las”. Esta gente de juízo fácil está cheia de certezas, cheia de pequenos moralismos para dispensar aos outros, cheia de si mesma, cheia de superioridade, cheia de uma convicção enraizada do abismo que as separa dos “outros”. Os “outros” são “pretos”, são “ciganos”, são “brasileiros”, são “estrangeiros”, são “criminosos”, são “pobres”. Não são pessoas completas. São um conjunto de abstracções e de preconceitos sociais. Não estão num patamar abrangido pelo direito inalienável à dignidade humana.

Não há sociedades sem crime e sem criminosos. O mais preocupante não é, obviamente, uma sociedade em que a criminalidade até pode ser mediática, mas está longe de estar fora de controlo. O preocupante é uma sociedade que quando olha para os seus membros não vê indivíduos, as suas acções e os seus laços sociais e em que o desprezo pelo próximo está tão disseminado, desde o cidadão anónimo à elite fazedora de opinião. Numa sociedade assim, o maior perigo vem de dentro.

Obras

O troço da CRIL que passa pela Buraca e pelo bairro de Santa Cruz está há anos para ser concluído. A obra pode ser muito importante e muito útil, mas quem já esperou tanto pode esperar mais um pouco. Não há justificação razoável para que os moradores, que já tanto têm que os apoquente, sejam obrigados a suportar 12 horas consecutivas de obras diárias, fins-de-semana incluídos, e que nem sequer respeitam os limites de ruído impostos por lei.

Medalhas porque sim

De repente, Portugal acordou a pensar que podia ganhar medalhas nos Jogos Olímpicos. Que não só podia, como devia ganhar medalhas. Ninguém se perguntou quais são as reais condições que os nossos atletas possuem para alcançar esse objectivo. Do conforto dos sofás, e à distância que a televisão permite, surgiram exigências difíceis de sustentar e as declarações manifestamente desastradas de alguns atletas em Pequim não ajudaram a criar observadores mais frios.

O talento treina-se. A mestria dá trabalho. Ser consistentemente bom requer disciplina. O desporto, qualquer que seja, pede dedicação, sacrifício, planeamento, investimento e superação. Num país em que raras actividades podem gabar-se de atingir elevados níveis de desempenho, por que é que com as prestações desportivas havia de ser diferente? Existe uma excelente desculpa para os maus resultados. Na realidade, a mais justa e a melhor de todas: os outros são melhores.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Modéstia à parte

Francis Obikwelu pediu desculpas por não ter conseguido oferecer ao país, pelo menos, uma final, quando este lhe pagou a participação nos JO. Obikwelu é medalhado olímpico, recordista europeu e uma das melhores coisas, senão a melhor, que aconteceu ao atletismo português nos últimos anos. Não deve nada a ninguém. A viagem a Pequim já a merece e ganhou há muito tempo.

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Partido Populista

Escapa-me por que é que há-de ser o governo a desenhar o plano de segurança dos bancos. O CDS-PP deve ter uma boa razão. Ou então não tem e apenas não consegue deixar escapar qualquer oportunidade para salivar a sua demagogia securitária.

Perspectivas

Enquanto a discussão sobre a criminalidade se centrar na nacionalidade de quem a comete, fala-se menos das condições sociais, económicas e demográficas dos criminosos. Mas que ninguém se preocupe. Quando lá chegarmos logo alguém virá falar em “sociologia desculpabilizadora”.

11 em 1000

Já o escrevi várias vezes: as estatísticas, em si mesmas, são muito pouco. Números são números e, se as coisas forem bem feitas, respondem a hipóteses construídas a partir de teorias. Andamos aqui a discutir se é mais rigoroso e objectivo dizer que a taxa de criminalidade dos estrangeiros é superior à dos portugueses ou se é igual. Questões de metodologia, portanto. O que ainda não se discutiu são as teorias que podem ajudar a interpretar os dados e que dão forma a todas as investigações. Existe alguma teoria que afirme que a nacionalidade influi na propensão para a criminalidade? Eu não conheço nenhuma. Nascer português, espanhol, brasileiro, angolano, ucraniano, etc. é relevante para a nossa relação com as leis? Certamente que sim, mas isso não se deve ao que está escrito no BI. Deve-se aos processos de socialização que cada sociedade proporciona aos seus membros, incluindo modelos culturais e estruturas sociais relevantes.
Mas, ainda que se recuse a adaptação metodológica do estudo, as taxas de criminalidade para portugueses e estrangeiros são, respectivamente, de 7 em mil e 11 em mil. É significativamente diferente. No pátio da penitenciária, os estrangeiros podem fazer um jogo de cinco para cinco, com um à baliza, e os portugueses só podem fazer um jogo de três para três, com um à baliza.

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Preconceituosos são os outros

Vamos supor que se pretende comparar o desempenho desportivo dos indivíduos de dois grupos distintos numa prova de resistência. Apura-se no final que os indivíduos do grupo A apresentam um desempenho notoriamente pior que os do grupo B. Contudo, sabe-se que mais de metade do grupo A é constituído por septuagenários e que no grupo B estes apenas ascendem a um quarto do total. Deve este dado ser ignorado na comparação que se pretende realizar? Não, não deve. A solução passa por ajustar as estruturas etárias dos dois grupos para que os dados sejam comparáveis, sob pena de se estar a desvirtuar as conclusões.

Foi isto que os autores do estudo comparado de taxas de criminalidade fizeram. O estudo não esconde que a taxa de criminalidade entre portugueses e estrangeiros em Portugal é distinta. Mas ajustada a estrutura da sociedade portuguesa à estrutura dos estrangeiros as diferenças desaparecem. Em condições semelhantes as taxas de criminalidade são semelhantes. Em condições diferentes as taxas são diferentes.
Comparar realidades diferentes dá trabalho e requer metodologias complexas e discutíveis. E pode ser sempre alvo de ataques por pessoas que usam como argumentos em seu favor a utilização de jargão científico por parte dos autores de um estudo que se quer científico.

Vamos repetir devagarinho para ver se o JCD percebe: “Em condições equivalentes de masculinidade, juventude e condição perante o trabalho” não é, nem pouco mais ou menos, o mesmo que dizer “Os portugueses que fazem parte do grupo dos que cometem crimes, têm tendência equivalente para cometer crimes aos imigrantes que cometem crimes.” A primeira é uma metodologia de comparação, a segunda é apenas uma algaraviada que em momento algum traduz fielmente o que se afirma no estudo.

Desculpas

Na semana passada, ainda no rescaldo do assalto em Campolide, Ferreira Fernandes assinou um artigo de opinião fazendo referência ao documentário Ónibus 174 em jeito de alfinetada nos “sociólogos desculpadores”. Ferreira Fernandes faz parte desse interminável contingente de indivíduos que não percebem a diferença entre compreender ou explicar um comportamento e aceitá-lo ou desculpá-lo, para o qual já vai sobrando muito pouca paciência. Mas neste artigo vai mais longe e, traído pela memória ou pelo preconceito, confunde a interpretação sociológica da criminalidade avançada pelo “sociólogo desculpador”. Não é que a sociedade não ligue aos bandidos (embora, efectivamente, não ligue), mas sim que não liga aos marginais (conceito bastante diferente de bandido), os quais têm na criminalidade, e sobretudo na criminalidade violenta, uma saída que lhes confere visibilidade e uma sensação de poder que não experimentam em nenhuma outra situação. Não é uma desculpa, é uma explicação e nada descabida.

O espaço diário de Ferreira Fernandes no DN é pequeno e não chega para contar a história toda. Deve ser essa a explicação para deixar de fora aspectos importantes que o documentário explora e que definem o desfecho do sequestro do Rio de Janeiro (a má preparação das forças policiais, a sujeição do poder político às pressões mediáticas, a ausência de soluções de prevenção da marginalidade e de reinserção social, o nível abjecto dos estabelecimentos prisionais no Brasil e o racismo que impera em todo o sistema policial e judicial). Deve ser essa também a justificação para que Ferreira Fernandes sintetize o desfecho do sequestro com “a morte de Sandro, o bandido, e de uma refém”. Convinha ter referido que a refém morre depois de alvejada quatro vezes: um primeiro tiro da responsabilidade de um elemento da polícia, que falha, a um metro de distância, o sequestrador, e os restantes da autoria deste último. Quanto a Sandro Nascimento, que sai ileso desta trágica intervenção, morre “misteriosamente” no carro celular durante o trajecto para a esquadra.

Dos criminosos espera-se que quebrem a lei. Das forças da autoridade espera-se outra coisa.

terça-feira, 12 de agosto de 2008

Criminalidade comparada

Citar notícias de jornais já foi chão mais seguro de pisar, mas o Público de hoje faz referência a um estudo que compara taxas de criminalidade cometida por portugueses e por estrangeiros em Portugal (disponível aqui). A conclusão é que, ajustada a estrutura social dos portugueses à dos estrangeiros, as diferenças desaparecem e a nacionalidade deixa de ser um factor de influência. O estudo permite ainda perceber que a nível concelhio não foi identificada qualquer relação entre presença de estrangeiros e criminalidade registada e que, afastada a variável nacionalidade, sobram as variáveis sociais e económicas como aquelas que possuem relevância estatística.

Ligeirezas

Nunca deixará de me surpreender a ligeireza com que algumas pessoas dispõem da vida e morte de outras.

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Racismo? Xenofobia? Nonsense...

Aliás, basta passar os olhos pelas caixas de comentários nos sites noticiosos ou no Youtube para o confirmar.