Na última página do Público, Vasco Pulido Valente espelha bem como uma quantidade assinalável de raciocínios rápidos e desordenados podem constituir algo que passe por opinião sobre um assunto. Para VPV, os JO transformaram-se numa aberração. A maior parte das provas clássicas não faz sentido; uma parte das modalidades recentes não faz sentido; a divisão e especialização das provas não faz sentido; o futebol não faz sentido; finalmente, o treino específico que os atletas de alta competição fazem cria “monstros”, “máquinas concebidas para meia dúzia de gestos, sem beleza e sem uso”. Esta última afirmação, para ficar apenas por aqui, é tão descabida como desinformada. A ideia que Pulido Valente tem dos atletas deve basear-se sobretudo nos praticantes das modalidades clássicas que “não fazem sentido”, como o lançamento do peso e do martelo. Modalidades onde ser baixo e pesado se torna uma vantagem porque o arremesso se faz num movimento giratório. Ninguém pede a um historiador que seja um especialista em física. Mas para quem parece abnegar a especialização dos atletas, algum ecletismo para os conhecimentos básicos que a maior parte dos jovens de 16 anos é obrigado a saber talvez não fosse má ideia.
VPV confunde deporto amador com desporto profissional e talvez sinta um excesso de nostalgia dos tempos em que aristocratas com penteados de gosto duvidoso circulavam com igual graciosidade nos salões de chá e nos courts de ténis e de badminton. Deve ser daqui que nasce a defesa do golfe, esse desporto em que 99% do tempo activo de jogo é passado a olhar para relva ou para as nuvens à procura de uma bola minúscula, como modalidade olímpica.
Para provar que definitivamente não sabe do que fala, VPV chega a utilizar Michael Phelps como um exemplo, quando o nadador americano não pode ser considerado outra coisa que não seja uma excepção. De tal forma é assim, que ninguém ganha 7 medalhas de ouro nuns JO desde os anos 70 - e Phelps leva para casa oito. De resto, nem se percebe o que VPV quer dizer quando afirma que “a ginástica, a natação e o mergulho (...) são tão minuciosamente divididas que um único atleta (...) consegue apanhar oito medalhas.” Qual é a alternativa? Uma única grande prova de natação em que cada um nada o que lhe apetece? Exigir aos ginastas que saltem directamente das argolas para o cavalo de arções sem tocar no tapete? Escrever disparates é reconhecidamente fácil. Mas não devia ser tão fácil.
A opinião publicada sobre o desporto e sobre os JO tem neste texto de VPV um bom exemplo do muito que se fez por estes dias. Avança-se com ideias rápidas e sonantes, mesmo que a realidade seja uma coisa bastante mais prosaica. Pelo menos, VPV tem o mérito de não alinhar na consensual crítica ao desempenho dos atletas portugueses e ter procurado uma abordagem diferente. Aliás, um dos traços característicos de VPV é assumir-se como uma excepção à regra. Assim uma espécie de Michael Phelps, mas ao contrário.
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