quinta-feira, 15 de abril de 2010

Um duplo erro

No mercado de trabalho, a relação de poder pende favoravelmente para as entidades empregadoras. Se não fosse por outras razões, o simples facto de haver mais procura do que oferta de empregos chegaria para compreender o que se passa. A isto junta-se uma realidade económica e social que penaliza fortemente o desemprego. O desempregado sofre um estigma social enorme, perde poder de compra e vê piorar, com o passar do tempo, as probabilidades de conseguir outro emprego.

Muito embora a retórica demagógica de direita equipare o desemprego subsidiado à preguiça, a verdade é que a maior parte das pessoas nessa situação preferiria encontrar um emprego decente e dignamente remunerado a passar os seus dias a olhar para as paredes do quarto. Como quanto mais tempo se passa desempregado mais baixa é a probabilidade de se ultrapassar essa situação, com o passar dos meses - por vezes, com o passar dos anos -, o desespero e a desmotivação aumentam exponencialmente. O subsídio de desemprego pode durar, no máximo, sensivelmente três anos, mas um crédito automóvel chega facilmente aos cinco ou seis anos e um crédito habitação pode ir até aos quarenta anos. A prazo, a verdade é que as necessidades financeiras pressionam qualquer desempregado.

Há uma razão social e moral para existirem protecções como o subsídio de desemprego, o rendimento social de inserção, o salário mínimo e as cargas horárias máximas de trabalho. Sem este tipo de bases mínimas, as pressões sobre todos os que procuram emprego conduziriam a uma espiral descendente da oferta de condições pelos empregadores. Medidas como estas destinam-se a introduzir patamares de justiça e dignidade abaixo dos quais a sociedade não reconhece legitimidade moral às condições de vida proporcionadas aos seus membros.

A liderança de Pedro Passos Coelho escolheu, simbólica e sintomaticamente, começar por atacar os mais fracos. Por uma questão de justiça e de modelo social e cultural, nunca deveria ganhar a oportunidade de implementar as violentas medidas que preconiza. Neste momento, com 10% de taxa de desemprego e com muitos mais portugueses que não sabem o dia de amanhã, são pelo menos 500.000 eleitores com boas razões para não votarem PSD. O tiro de partida de Passos Coelho revela, afinal, não ser mais do que um erro social e político.

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